L'ennemi

Voilà que j'ai touché l'automne des idées
Baudelaire

vendredi 4 mai 2018

Ofício de mulher

Quero chorar e não posso
Desfazer meu remorso,
Dizer que menti,
Confessar que errei.
Quantas mentiras criei?

Das culpas que senti,
Só me restam o amargo,
E na boca o trago.

O corpo em sacrifício,
A imagem (descrente),
Recatada e decente,
Da mulher por ofício.

jeudi 16 mars 2017

Conta-gotas

Na janela do meu quarto,
repousa o sol sobre a lagoa.
O rosto sereno e maltratado
envenena o sabor da boca.

A memória, como um fardo,
acima do pensamento voa,
revive o amor passado
e o esgota gota a gota.

mercredi 15 mars 2017

Escravos de Jó

Os anos passaram
De maneira tão pesada
Que carrego em meu corpo
O cheiro d'alma em brasa.

E, da janela aberta,
Não pude ser mais nada:
Nem donzela em perigo
Nem puta apaixonada.

E, como cão sarnento,
O futuro volta à senzala,
Mordendo os calcanhares
Da existência apassivada.

mercredi 26 octobre 2016

Efígie

e pensar na vida
abstratata realidade
e na história
que tenho inventado
e sentir por tudo
que trago na alma
e no vazio
que tenho chorado
ao ver na imagem
que conheces a felicidade
e na mulher
que sorri ao seu lado
a mesma dor fúnebre
que me roubou a sanidade

mercredi 7 septembre 2016

Viva a democracia!

No centro do poder,
Espanta-me a indignidade.
Não se pode resolver
A falta de plausibilidade.

Enquanto uns gritam:
“Viva a democracia,
Viva o desejo da burguesia!”,
Outros morrem.

E a luta continua:
“Não queremos retrocesso!
Não queremos ditadura!
Nem a liberdade como preço
           De uma pátria sem censura!”.

mardi 6 septembre 2016

Mulher Brasileira

Nasci humana,
Nasci pobre.
Cresci mulher e pobre,
Não pobre mulher.

Na alma, carrego minha verdadeira pátria,
Na vida, luto por todos os meus direitos,
Na voz, grito o Brasil inteiro.

Vivi mulher
Humilhada,
Indigna,
Assediada.

Na voz, grito todos os meus direitos,
Na vida, luto por minha verdadeira pátria,
Na alma, carrego o Brasil inteiro.

Ressurgi Amanda,
Guerreira,
Dilma,
Mulher brasileira.

mardi 6 octobre 2015

Severa

Do alto me cai um pensamento:
De chegar ao limite do limite
De minha mente esquizofrênica,
Do oco casco que descasca
E se solta do corpo inválido
E resgata minha alma afetada
Do delírio deformante
De razão deformada,
De agonia deturpante
De alegria deturpada.
                                  Da dilacerada vida suspeita,
                                  Do sôfrego suspiro suspenso
                                  Era tudo,
                                  Era nada.
                                                 Apenas era.

dimanche 27 septembre 2015

Incorpóreo

Quando do tempo
A morte vem me cobrar
Cada suspiro de vida,
Resta em mim o silêncio.

-- Veneno palatal
De afrasia agonizante.

Quando da palavra
A mentira vem me retirar
Cada sopro de verdade,
Resta em mim a culpa.

-- Histeria mental
De complexo freudiano.

Quando da noite
O medo vem me dilacerar
Cada pedaço de sonho,
Resta em mim a vigília.

-- Angústia letal
De alma deprimente.

A vida me era um quase.
Quase me era.
Quase.

vendredi 10 avril 2015

Na poesia

Não há um só verso em meu lápis,
Cada página de meu livro experimenta
O mesmo branco-amarelado há anos.

Não há um pensamento sequer!
Tudo é abstrato: abismo escuro, insípido...
O mesmo nude-chic da moda.

mardi 19 novembre 2013

Av. Fernandes Lima

Sobre duas rodas
Na Fernandes Lima
Tráfego intenso
Ainda suspiro
Quando em pensamento
Murmuro teu nome
No despertar
Despertar como de quem sonha
Meu corpo queima
Como queima
O meu nome em cada letra
Nas cinzas, no pó
Le souvenir errant
Da essência do que somos
Do instante do que fomos